Abertura dos Trabalhos da Noite, com o Profo. Roberto Rodrigues e
a Confreira Márcia Parente (meditando).
a Confreira Márcia Parente (meditando).
Em noite que se revelava promissora, a Confraria Des Amis du Mouton se reuniu, mais uma vez, na ABS-Rio, continuando o seu ciclo de degustacões dos vinhos das diversas regiões produtoras da França. Na ocasião, foram degustados, às cegas, de modo muito prazeroso, quatro excelentes champagnes e um espumante de altíssima qualidade, imiscuído entre eles.
Todas as garrafas foram cuidadosamente camufladas em papel aluminizado,
numeradas de 1 a 5 e servidas próximo da temperatura ideal.
Visão Geral da Grande Mesa de Degustação, com o Grupo já preenchendo
a Ficha de Avaliação.
a Ficha de Avaliação.
Antes de servir os vinhos, como de praxe, o Coordenador do Grupo, Professor Roberto Rodrigues, nos discorreu, de modo bastante didático, para recordar, sobre a Região da Champagne e sobre a elaboração do Champagne.
Desde o século V, os romanos já produziam uvas e vinhos na região da Borgonha, no centro da França. Os vinicultores ao norte, em Champagne, tentavam produzir vinhos, mas enfrentavam alguns problemas, devido às diferenças de clima e solo (Champagne situa-se no limite geográfico da região propícia para o cultivo): as uvas da Champagne tinham mais dificuldade em atingir o ponto de amadurecimento, tornando-se, com isso, mais ácidas e menos doces.
Foi o lendário Dom Pérignon (Pierre Pérignon: 1639-1715), tesoureiro da Abadia de Hauvillers, o homem que mais inovou na vitivinicultura da Champagne. Ficou tão famoso, que a ele se atribui a própria invenção do champagne, o que, hoje, embora sem pretender diminuir os seus méritos, é bastante questionável.
De acordo com a legislação francesa (Appellations d'Origine Controlée ou AOC), o termo Champagne somente pode ser aplicado aos vinhos produzidos na região de Champagne, situada bem ao norte da França, a cerca de 150 km de Paris. “Champanhes” produzidas em outras regiões do mundo são, na verdade, “vinhos espumantes” e adotam nomes regionais, a saber: Cava, na Espanha; Sparkling Wine, nos países de língua inglesa; Asti, no Piemonte; Prosecco, na rigião do Vêneto; Sekt, na Alemanha e, por fim, Espumante, no Brasil.
Champagne se localiza sobre ondulações, colinas de 150 a 200 m de altitude. O solo é calcáreo e corresponde a 49 graus de latitude Norte, região bastante fria, zona de transição entre os climas de influência oceânica e continental. A temperatura média anual é situada em torno dos 10 Graus Celsius; as chuvas caem entre 600 e 700 mm. Uma maior insolação de determinado vinhedo é fundamental, para que a safra seja apropriada para a elaboração de um millésime.
A área de produção da Champagne é de 35.000 hectares e as Regiões são quatro:
Vale do Rio Marne, Montagne de Reims (que, juntamente com a Côte des Blancs tem o melhor terroir da Champagne), Côte des Blancs e Região Sul, compreendendo Sézane e Aube, região mais recente, continuação da Côte des Blancs (predomínio da Chardonnay).
As tres uvas permitidas na Champagne são as tintas Pinot Noir e Pinot Meunier e a branca Chardonnay.
A Pinot Noir dá estrutura, corpo e aptidão para o envelhecimento do vinho. Mais encontrada em Montagne de Reims, na Região Sul e, em menor quantidade, no Vale do Marne.
A Pinot Meunier contribui com a fruta e a maciez e é produzida em maior escala no Vale do Rio Marne.
A Chardonnay aporta elegância, acidez e fineza ao vinho, sendo mais cultivada na Côte des Blancs e, em menor proporção, na Reg. Sul.
As uvas tintas são, é bom lembrar, vinificadas em branco e em separado, representando cerca de 75 % da produção; o restante é preenchido pela Chardonnay. Os rosés são elaborados com uma mistura de vinhos brancos e tintos e não pelo método de sangria (feito pela maceração interrompida das cascas de uvas tintas no mosto).
Depois desse Preâmbulo, passemos à vinificação, que, na Champagne, é feito pelo "Métode Champenoise".
A cuidadosa colheita manual e seletiva é realizada, colocando-se as uvas em caixas de plástico, com capacidade para até oitenta quilos de uvas.
As uvas são, então, levadas imediatamente para os lagares e se inicia a prensagem, em cachos inteiros, sem desengace.
Fermentação:
Antes da fermentação, o mosto é decantado (para a limpeza do mesmo). Acrescentam-se as leveduras selecionadas e tem início a fermentação alcoólica, em temperatura controlada, na faixa de 18-20 Graus Celsius. Nesse processo, o açúcar se consome, transformando-se em álcool e gás carbônico (num prazo de uns dez dias)
A seguir, começa a fermentação malolática, que é o processo pelo qual o metabolismo das bactérias (leveduras) transforma o ácido málico em ácido lático. Trata-se de uma etapa importante, que leva ao melhor caminho para baixar a acidez do vinho.
Finalizada a etapa da fermentação, o vinho passa pelo processo da clarificação e é trasfegado para piletas, onde se armazena. Então, o Enólogo inicia as degustações, de tempos em tempos, do vinho, que, agora, passa a ser chamado de "vinho-base". para avaliar as suas características organolépticas.
Assemblage:
Somente alguns vinhos-base, obtidos pelo método acima descrito, terão um ótimo equilíbrio de aromas e de acidez, necessário para se elaborar um bom champagne. É aí que entra a habilidade do Enólogo, que realiza a mistura de vinhos diferentes, de diversas procedências, com o objetivo de encontrar o melhor vinho-base possível. Esse procedimento é chamado de Assemblage e se constitui no grande segredo na elaboração de um bom champagne.
Vinhos-reserva de safras anteriores também entram no assemblage, prática que foi criada por Dom Pérignon e que se mantém através dos tempos. Podem-se utilizar de cinquenta a oitenta vinhos-base, mistura que leva a uma cinergia entre os vinhos componentes, o que resulta num "cuvée" ou mescla de vinhos, de melhor qualidade do que a de cada vinho isoladamente.
Mas não nos deixemos esquecer dos champagnes especiais, os Millésimés, elaborados com uvas de uma única safra. São Champagnes de excelência, de preço bem mais elevado, e elaborados em anos de safras excepcionais.
Segunda Fermentação:
Etapa do Licor de Tirage -
Aqui, o vinho é resfriado e filtrado. Por causa das fermentações, o vinho ficou seco, isto é, sem açúcar e sem leveduras. Assim, se adicionam leveduras e açucar, para se obter uma segunda fermentação. Para se obter a pressão mínima, que é de 5 atm., colocam-se de 24 a 25 g de açúcar por litro de vinho: É feito um licor de Tirage, composto de vinho e açúcar, que se adiciohna ao vinho-base.
Quanto às leveduras, devemos acrescentar que elas precisam ser bastante adaptadas para a sobrevivência e fermentação desse vinho, que se tornou um meio hostil para os microorganismos, devido ao álcool e ao anidrido sulfuroso (que são potentes inibidores dos processos biológicos). Cada produtor tem as suas próprias leveduras, cuja composição e método de adaptação se constitui numa espécie de "segredo de estado".
Acrescentam-se clarificantes ao vinho, com o objetivo de facilitar a "remuage". Chegada a esta etapa, o vinho passa a ser engarrafado em garrafas de vidro espesso, capazes de suportar as altas pressões em seu interior. Após, as mesmas são fechadas dom chapinhas de metal, iguais às de refrigerantes e cervejas. As garrafas são empilhadas na posição horizontal, nas caves, enormes galerias cavadas no subsolo, onde a temperatura é bastante baixa.
Prise de Mousse ou Tomada de Espuma:
É a segunda fermentação, que resulta no champagne, com suas borbulhas características. Aqui, o açúcar do licor de tirage se transforma em álcool, liberando o gás carbônico, agora retido na prisão da garrafa fechada. Esse processo se dá no período que varia de quatro a seis semanas e se realiza na temperatura natural das caves, que gira em torno de 12 a 13 Graus Celsius, temperatura ideal para uma apropriada integração entre o gás e o vinho.
Envelhecimento:
As garrafas permanecem nas caves pelo período de, no mínimo, um ano, para os champagnes clássicos e de tres anos para os millésimés. Os melhores clássicos ficam por um prazo de dois a cinco anos, sendo que os grandes cuvées, de maior estrurura, podem podem envelhecer por até dez anos.
Durante o período de Envelhecimento, ocorre a Autólise das leveduras, pois elas não sobrevivem à segunda fermentação. O vinho, então em contato com essas leveduras mortas, vai adquirir maturidade e a tão desejada complexidade aromática.
Remuage:
Nessa etapa, as garrafas passar para as "pupitres", uma espécie de cavalete, com os gargalos inclinados para baixo. Diariamente, o funcionário encarregado ("remueur") faz um ligeiro movimento de rotação e de inclinação, direcinando a garrafa, aos poucos, para a vertical, com o objetivo de fazer com que o depósito se acumule na saída do gagalo. Um só remueur é capaz de girar milhares de garrafas por dia e a profissão passa de pai para filho. Esse método manual vem sendo substituído pelas giropaletas, que são máquinas apropriadas para a tarefa. O motivo desse árduo trabalho é a clarificação do vinho, que resulta turvo da segunda fermentação pela presença das células das leveduras mortas. É necessária a remoção desse sedimento, sem a perda do gás carbônico.
Dégorgement:
Nessa etapa, procede-se o congelamento dos sedimentos concentrados junto à tampa de metal, enfiando-se o gargalo das garrafas em uma solução de baixíssima temperatura. Colocam-se, a seguir, as garrafas na posição em pé e se removem as chapinhas de metal. Os resíduos congelados são expulsos pela pressão do interior da garrafa. O volume é completado pelo "liqueur d'expidition", cuja base é o açúcar de cana. Podem ser acrescentadas outras substâncias, como o conhaque, para o aporte de aromas.Dependendo da quantidade adicionada, o champagne será brut, sec, demi-sec, doux, etc.
Por fim, as garrafas recebem as rolhas apropriadas de cortiça, guarnecidas por arame, a gaiola ou "muselet", necessária para sustentar a pressão interna, que gira em torno de 6 atm. As garrafas seguem para as caves, onde permanecerão deitadas, por muitos meses, para a incorporação de licor de expedição ao vinho. A rotulação é procedida mais tarde, na fase de comercialização do preciosa líquido.
Armazenamento:
Os Champagnes clássicos devem ser bebidos no prazo de um ano, depois que chegam ao mercado consumidor. Apenas os cuvés e os millésimés melhoram com a guarda por mais tempo, pois ganham complexidade aromática. Os melhores champagnes podem ser guardados por décadas e envelhecem de modo admirável.
Quato à doçura, os Champagnes se classificam em:
Brut Nature (ou pas dosés) - Sem adição de açúcar;
Estra-Brut - Adição de até 6 g de açúcar por litro de vinho;
Brut - Menos de 15 g/l;
Extra-Dry - Entre 12 e 20 g/l;
Sec - Entre 17 e 35 g/l;
Demi-Sec - Entre 33 e 50 g/l;
Doux - Mais de 50 g/l.
Classificação do Champagne Quanto à Categoria:
NV (Non Vintage) - Trata-se do champagne mais comum, elaborado com uvas de várias safras;
Vintage ou Millésimé - Champagne elaborado com uvas de uma mesma safra, que deve ser excepcional;
Cuvée Prestige ou Special Cuvée - Pode ou não ser de uma mesma safra, mas normalmente é elaborado por uma mistura dos vinhos dos melhores vinhedos da Casa.
Blanc de Blancs e Blanc de Noirs:
Champagne elaborado apenas com a uva branca Chardonnay. O Blanc de Noirs com as uvas tintas Pinot Noir e Pinot Meunier, vinificadas em branco (sem o contato com as cascas, onde se encontram os antocianos, pigmentos que dão cor ao vinho).
Classificação do Produtor - Aparece em letrinhas no rótulo do vinho: NM, RM, CM, RC, etc.
Classificação dos Crus da Champagne:
Mais de trezentas comunas possuem classificação de terroir e ela determina o preço a ser pago por quilo de uva da região.
Grand Cru - Refere-se ao que há de melhor dos terroirs da região, pagando-se 100 % do valor máximo da uva ao produtor. Existem dezessete comunas que fazem parte dessa classificação e é dessa região que provêm os melhores champagnes.Os critérios que determinam a qualidade são o subsolo (calcáreo). a declividade do terreno, a ótima exposição ao sol e as castas Chardonnay e Pinot Noir.
Premier Cru - É a segunda em importância e engloba cinquenta comunas. O preço das uvas gira em torno de 90 a 99 % do preço máximo.
Restante do Terroir -
Compreende duzentas e vinte e quatro comunas, principalmente no Vale do Marne. Aqui, as uvas são vendidas por preço 80-89 % do preço da reg, Grand Cru.
Depois da Aula, Mestre Roberto Rodrigues iniciou o Serviço dos Vinhos, em taças numeradas de 1 a 5.
Vinho 1`-
Bela cor amarelo-ouro clara, com aromas de leveduras, fungo porcini, pêssego, abacaxi, manteiga e nozes.
Vinho 2 -
Também Amarelo-ouro claro, revelando uma explosão de aromas de amêndoas torradas, café, algo mineral... Frutas maduras e secas, leveduras e bala de café e caramelo.
Vinho 3 -
Bela cor Amarelo-palha clara, com aromas de frutas secas, maduras (pêssego, damasco), Mais fresco: Lima, fruta do conde.
Vinho 4 -
Cor semelhante à anterior, com aromas de café, avelã, leveduras e discreto amanteigado. Este vinho é melhor na boca que no nariz.
Vinho 5 -
Bela cor Amarelo-ouro clara, com aromas de amêndoas torradas, aromas de padaria, frutas maduras, frutas secas, mel e discreto mineral.
Terminada a cuidadosa degustação , o segredo foi revelado:
V1 - Cave Geisse Terroir Nature, 2002, produzido pela Cave de Amadeo, Serra Gaúcha, Rio Grande do Sul, Brasil.
V2 - Champagne Barnaut Grand Cru Blanc de Noirs, 12 % Vol., produzida por Barnaut.
V3 - Champagne Piper Heidsieck, produtor de mesmo nome. Vinho gentilmente ofertado ao Grupo pela Confreira Márcia Parente, que o fez acompanhar por finas fatias de salmão levemente defumado, creme azedo(creme de leite e limão) e pães.
V4 - Champagne Pommery Brut Royal, produzido por Pommery
V5 - Champagne Krug Grande Cuvée Brut, 12 % Vol.
Todos os Champagnes foram muito apreciados, recebendo uma média alta nas notas dadas pelos degustadores, sendo que o V2 teve a maior pontuação.
O Espumante, imiscuído entre os champagnes, fez belo páreo, sendo mesmo confundido com estes.
Enfim, realizamos uma memorável experiência, de intenso prazer e aprendizado, que torna a Confraria cada vez mais motivada e preparada para desvelar novos caminhos, na trilha da Enogastronomia.
Belos champagnes! Parabéns!
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